Rosângela Florczak: Intensidade em busca de equilíbrio

Jornalista, professora e empresária, ela se doa inteiramente a tudo que faz

Nascida e criada no interior do Rio Grande do Sul, em Guarani das Missões, uma cidade de pouco mais de oito mil habitantes, Rosângela Florczak de Oliveira sempre se sentiu meio deslocada. Não gostava da região, pois queria conhecer o mundo que ela sentia acontecer tão longe. Não se encaixava, até perdeu amigos na adolescência por ser 'diferentona'. Aos 11 anos, leu a trilogia de Erico Verissimo 'O Tempo e o Vento': O Continente, O Retrato e O Arquipélago. Aos 13, já era fã de bossa nova, adorava João Gilberto. "Eu vivia num universo paralelo", diz ela.

Um ano depois, a adolescente descobriu a primeira e eterna paixão: o Jornalismo. Na escola, viu um cartaz anunciando o curso, mas não fazia ideia de que ensinavam alguém a ser jornalista, apenas soube que era o que ela queria ser. Precisou driblar a vontade dos pais, Inês, 73 anos, e Tito, 79, que queriam que ela estudasse Ciências Contábeis. Já tinham até traçado o futuro profissional da filha: estudaria em Santo Ângelo, faria estágio na empresa de um amigo da família, poderia fazer um concurso ou, ainda, ter a chance de ser a primeira contadora da cidade, que não tinha nenhum escritório da atividade na época.

Irmã mais velha de Paulo Henrique e Eduardo, Rosângela também se sentia um pouco mãe dos irmãos. Ensinou-os a ler, ajudou a criá-los, deu broncas, fez o que pôde para auxiliar os pais que, hoje aposentados, trabalhavam como agricultor e dona de lojas de roupa. Em meio a risadas, a jornalista recorda alguns momentos da mãe, dona Inês. Na infância, quando adorava brincar na rua, havia uma regra que não podia ser burlada nunca ou a matriarca ficava furiosa: quando o sino da igreja batesse, às 18h, ela precisava estar de volta. A mãe, que diz ser aposentada mas todos sabem que trabalha escondida pois não gosta de ficar parada, é cheia de orgulho da filha. Ela chega a anotar num papelzinho sempre que Rosângela vai viajar para contar às amigas os destinos que a primogênita vai conhecer.

A rua, que era local de diversão quando criança, segue sendo um de seus lugares preferidos. Não gosta de shoppings, tem buscado viver uma vida com menos consumo, ama caminhar ao ar livre e passear numa praça. Para ela, dias de sol e céu azul são emocionantes. "Fui criada no campo, gosto da natureza, de observar dias bonitos e agradecer por estar viva", afirma. Também professora universitária de comunicação na ESPM-Sul, Rosângela costuma aproveitar o ar livre para corrigir trabalhos de conclusão de curso dos alunos. Sentada numa cadeira confortável, em um clube de onde é sócia em Porto Alegre, lê e nem vê o tempo passar, unindo o útil ao agradável.

Gestão de crises

Para custear a vida em Santa Maria, onde cursou Jornalismo na universidade federal e foi aprovada em 6º lugar do vestibular, começou a trabalhar cedo. Aos 17 anos, no segundo semestre da graduação, conseguiu sua primeira oportunidade: estagiária do já extinto jornal 'O Expresso'. Ao longo dos 30 anos de carreira, fez um pouco de tudo - e se apaixonou intensamente por cada experiência. Foi repórter, secretária de redação, editora, assessora de imprensa, gestora de comunicação corporativa, professora, até descobrir seu atual amor: a gestão de crises.

Atendendo como consultora há cinco anos na área, Rosângela está repaginando a empresa, que se será lançada oficialmente no próximo mês e se chamará Verity Consultoria, ao lado da sócia, a psicóloga Cloá Steffen. Ela quer fazer diferente, não simplesmente apagar incêndio, nem ser uma agência que "entrega diversos serviços num 'pacotão' mas não é especialista em nada". Pesquisadora e entusiasta do assunto há alguns anos, posiciona a marca com a cultura do cuidado para prevenção. "Dou aula de gestão de crise, comunicação e responsabilidade social, e ética e responsabilidade empresarial, todas elas convergem entre si para esse tema", ressalta ela.

A história sobre se tornar professora também é curiosa. Não queria de jeito nenhum. Jurava que nunca entraria em uma sala de aula a não ser como aluna. À frente da comunicação corporativa da Rede Marista, onde trabalhou por 13 anos, decidiu fazer mestrado, quando pesquisou a comunicação nas organizações educacionais, porque sentia que o mercado estava pouco desafiador, mas ficava irritada quando algum professor se referia a ela como futura professora. Não esperava nem o docente terminar de falar e já respondia: "Eu não serei professora, estou aqui pra qualificar meu repertório profissional, mas vou continuar somente no espaço das práticas". Concluiu a pesquisa em 2009 e mal sabia que, três anos depois, usaria toda sua intensidade para repassar conhecimento aos próximos jornalistas.

Não estava segura quando aceitou o desafio de ministrar uma disciplina de assessoria de comunicação. Na aula-teste, conta que foi um desastre, não sabia como ensinar, foi repreendida pela diretora por colocar as mãos no bolso, enfim, só queria sair correndo. Aula vai, aula vem, foi pegando o jeito e se encantou tanto com a nova profissão, que deixou os Maristas em 2014 para se dedicar exclusivamente ao ensino. Agitada por natureza, confessa que não conseguiu ficar somente em uma atividade, "mas eu tentei", brinca ela.

Mãe e filha

Por algum tempo, Rosângela admite que só namorava jornalistas. Um dos relacionamentos, por exemplo, proporcionou a experiência de trabalhar em São Paulo, dentro do terminal Tietê, pela agência ADS, onde conheceu repórteres renomados e onde, também, aprendeu muito sobre como ser jornalista. Aos 29 anos estava em outros ares, casou-se com um engenheiro, Eduardo, pai de sua única filha, Anna Carolina, hoje com 17 anos.

O nascimento da herdeira a fez começar a ver o mundo de forma diferente. Já não queria viajar tanto a trabalho, nem entrar madrugadas atendendo aos clientes ou perder os finais de semana em família. Até pensava em ter outro filho, queria um casal, mas conta que Anna atendeu tanto sua dimensão materna, que resolveu parar nela. "Anna foi uma criança muito querida, deu pouco trabalho. Ser mãe foi, e é, uma experiência incrível", derrete-se ela.

Segundo Rosângela, Anna é muito parecida com ela, sonha em trabalhar com a mãe, mas não quer fazer Jornalismo "só pra contrariar". Independente, fez intercâmbio aos 15 anos no Canadá e já fala em morar sozinha em São Paulo para estudar Relações Internacionais. Feminista e vegetariana, é a adolescente, também, quem incentiva a mãe a se alimentar melhor e se envolver em causas sociais. Grudadas, as duas adoram fazer maratona de Netflix - atualmente, estão curtindo cinema francês -, experimentar novos chás, ou apenas ficar juntas fazendo qualquer coisa.

Do mesmo modo como é referência para a filha, Rosângela também revela um carinho especial por outra mulher, a quem considera "guru": a professora Cleusa Scroferneker, que foi sua orientadora no mestrado e no doutorado, na PUC, e com quem ainda se aconselha sempre que precisa. Não gosta de falar muito sobre isso para não parecer pretensiosa, mas a acolhida também se estende aos seus próprios alunos, pois senta no bar com os aspirantes para tirar dúvidas, toma longos cafés para ouvi-los desabafar, gosta de fazer com que os que estão à sua volta se sintam bem. "Dizem que eu sou generosa, gosto de ajudar, preciso ver todo mundo bem e feliz", reflete.

Amor nas alturas

Aos 48 anos, Rosângela conta que está vivendo um momento privilegiado. Credita a maturidade à sabedoria para priorizar uma vida mais equilibrada entre pessoal e profissional. Divide-se entre a Verity, a ESPM e a direção regional da Associação Brasileira de Comunicação Empresarial no Rio Grande do Sul (AberjeRS). Fora do trabalho, busca aproveitar o tempo com a filha, os irmãos, os pais e também com o namorado, Mauro, que trabalha na área de Tecnologia da Informação (TI), com quem está há um ano e meio.

Dizem que é quando a gente menos espera que as coisas acontecem. Foi assim para o casal Rosângela e Mauro. Conheceram-se no avião, ele a reconheceu do Facebook e de uma revista, e puxou assunto. Ficaram um tempo se falando esporadicamente e, em maio de 2018, começaram a namorar. A jornalista conta que a filha diz que o namorado é a versão masculina dela, almas gêmeas. Com as agendas apertadas, ficar junto às vezes é um desafio, mas eles lidam bem com isso. No dia da entrevista, por exemplo, tomaram café juntos antes de ela encontrar a reportagem e ele ir para outro compromisso.

Os gostos semelhantes fizeram Rosângela ainda mais feliz. Apreciadora de vinhos, encontrou no namorado a companhia perfeita para viajar em busca das melhores garrafas. Amam um Malbec argentino e um Tannat uruguaio. Ela gosta de combinar com carnes, assados e uma salada bem bonita. Sensibilizada com as crenças de Anna, está tentando diminuir o consumo de carne.

Leitora voraz

Em se tratando de religião, considera-se católica praticante. Mora em frente à Paróquia Nossa Senhora de Mont'Serrat, em Porto Alegre, e procura ir à missa sempre que pode. Para ela, a religião tem um caráter de reconexão consigo mesma. Também pratica Yoga e meditação. "Não sou ortodoxa, mas sou praticante, pago o dízimo e tudo", comenta ela.

Gremista desde pequena, gosta de acompanhar os jogos, mas vai ao estádio com menos frequência do que gostaria. Um dos hobbies favoritos é a leitura. Menciona que a pilha de livros no criado-mudo está tão grande, que ameaça cair. Lê várias obras ao mesmo tempo, relê e etc. A paixão é antiga, já que, quando escolheu ser jornalista, comprou vários títulos por correspondência sobre a profissão para estudar em casa, até que chegasse a idade de ir para a faculdade. Na mesma época, também gastou a máquina de escrever, que até hoje está guardada na casa dos pais, escrevendo crônicas sobre os momentos políticos e econômicos mundiais.

Mistura diversos autores e estilos de literatura. Gosta do técnico, como 'O Feitiço das Organizações', de Maria Aparecida Rhein Schirato;  'Gestão de Crises e Comunicação', do gaúcho José Forni; até a poesia de Carlos Drummond de Andrade. Mesmo após a conversa, faz questão de mandar para a reportagem a foto da capa do livro que está a mobilizando hoje: 'Sociedade do Cansaço', de Byung-Chul Han. Na música, também tem vários nomes para citar. O gosto pela bossa nova, desenvolvido na infância, a acompanha até agora. Acorda e já coloca música brasileira para tocar, prática que inclui Gilberto Gil, Caetano Veloso, Tiê, Ana Carolina, Anavitória. Seu preferido é Nando Reis, é fã assumida, tanto que vai a todos os shows que ele faz por aqui.

Medo de arriscar não é algo que faz parte de Rosângela. Se tivesse mais dinheiro, diz que moraria em Londres, seu lugar predileto no mundo. Não curte roteiros 'turistão', gosta de explorar os países tal qual seus nativos. Gostou muito da Bélgica, do norte da França, da Costa Rica, entre outros. Outro receio que não a assombra é chegar aos 50 anos. Pelo contrário, garante que não trocaria a idade que tem agora pelos 22. A intensidade é sua marca registrada e também o que ela considera como a maior qualidade, pois se dedica muito em tudo que faz. Em contrapartida, o defeito está perto: é muito exigente e espera dos outros a mesma dedicação. Defensora do diálogo e da causa da comunicação, define-se como uma pessoa de extremos: "Sou muito forte e muito sensível ao mesmo tempo, mas, se for preciso escolher entre sucumbir ou enfrentar, sempre escolho enfrentar", resume.

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