Bruno Teixeira: Viver da arte de realizar sonhos

Entre microfones, recomeços e camisetas do Grêmio, o repórter da CNN conta sua história com sensibilidade, arte e paixão

13/06/2025 18:14
Bruno Teixeira: Viver da arte de realizar sonhos /Crédito: Arquivo Pessoal

Por trás da câmera, um cara que já foi do mato à Paulista, que jogava taco nas ruas de chão batido e, hoje, corre atrás de pauta. Bruno Rosa Teixeira é jornalista, gremista, idealista, noveleiro e bastante filosófico. É o que se pode desvendar quando o entrevistador vira entrevistado. São essas nuances de quem, com apenas 33 anos, viveu em um mundo diverso e plural que usa para contar suas histórias. E, para exercer essa vocação, ele usa e abusa do que tem de mais valioso: a sensibilidade.

Nascido no bairro Belém Velho, na Zona Sul de Porto Alegre, Bruno cresceu em um lugar que até hoje guarda aquele charme de Interior. Tardes de brincadeiras no mato, jogos de taco, esconde-esconde e a infância sempre perto dos avós, dos pais e do irmão Vinicius. 

O pai, José Luis Teixeira, técnico em segurança do trabalho, e a mãe, Celina Juvelina Rosa Teixeira, dona de casa, foram a base sólida dessa fase simples, mas cheia de afeto. ?Eu tive uma infância muito feliz?, diz, com a naturalidade de quem ainda visita a casa onde tudo começou.

Entre a novela e o rádio

Bruno gosta de ficar em casa e, de vez em quando, assiste novelas. Foi a reapresentação de 'Tieta' que o levou a comprar o livro homônimo de Jorge Amado e a se aproximar das canções de Caetano Veloso. A curiosidade pelo artista ficou tão aguçada que  acabou comprando um vinil do álbum 'Estrangeiro', em plena avenida Paulista. 

?Um dia, estava saindo do plantão e vi um cara vendendo LPs. Quando olhei, encontrei o álbum que tem a música da novela, 'Meia Lua Inteira', e comprei?, conta o jornalista, movido pelo impulso curioso que parece reger boa parte da vida. Agora, ?só falta comprar a vitrola?, brinca Bruno, confessando que ainda não tem o aparelho em casa.

Talvez tenha sido o encantamento de quem já 'sumiu mata adentro' que o fez olhar de forma diferente para Caetano. Ou talvez seja a identificação do gaúcho do Belém Velho, criado no mato, com o sentimento de ser ?um estrangeiro? em meio à selva de pedra da capital paulista.

Não por acaso, o som sempre esteve por perto: o rádio era onipresente em casa. A Gaúcha, a CBN, os programas esportivos. É ouvindo tudo isso que, até hoje, Bruno toma chimarrão aos domingos, com a camiseta do Grêmio e o fone no ouvido - um ritual afetivo que atravessa décadas. Bruno relembra que a CBN nacional era a trilha sonora da casa dos pais, a companhia silenciosa que narrava o mundo enquanto a vida acontecia no Belém Velho. E foi justamente nessa frequência que um dos seus primeiros sonhos ganhou sinal verde: trabalhar em rádio.

Na Gaúcha, onde entrou ainda durante a faculdade, Bruno viveu os anos mais intensos do início da carreira. Primeiro na produção, depois na reportagem, sempre com o senso de urgência ligado no volume máximo. Eram tempos de Lava Jato, impeachment, crise política. A adrenalina tão grande quanto a responsabilidade, e ele se jogou de cabeça. No penúltimo semestre da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs), Bruno estagiou durante três meses na editoria de Cultura do Jornal do Comércio até ser admitido como estagiário no Grupo RBS. 

Um microfone e um ideal

Na rádio Gaúcha passou pela produção, reportagem e foi âncora da CBN Porto Alegre. Aprendeu com quem admirava: Andressa Xavier, Daniel Scola, Davi Coimbra, Kelly Matos, Luciano Potter e Sara Bodowsky. Esses são alguns colegas que vêm à mente quando relembra o início da carreira. 

Mas a inquietude e o idealismo que movem Bruno o levaram a outro desafio, ainda na época de universitário. Ao lado da ex-colega e jornalista Iarema Soares, criou o podcast 'Coisa de Preto', em 2019. A proposta era simples, mas potente: entrevistar pessoas negras que ocupam espaços onde, historicamente, não foram imaginadas. ?A ideia era mostrar que a gente está em todos os lugares, e que é importante sermos vistos e ouvidos nesses espaços?, resume.

O podcast ganhou elogios e uma menção honrosa em um prêmio da CBN, mas acabou sendo descontinuado por uma mudança de estratégia da empresa. Ainda assim, ele lembra do projeto com brilho nos olhos: ?Ele me deu rosto. Pessoas de fora do Estado começaram a me conhecer por ele?. Foi ali que a ideia de mudar de cidade começou a ganhar força.

Por essa mesma razão, Bruno recusou o convite para assumir a vaga de repórter em outra emissora, para atuar em um quadro semelhante ao 'Periferia', no Jornal do Almoço, apresentado na época por Manoel Soares. Longe de desmerecer a importância do papel, que, para ele, tem um valor imenso, sentia que aquela função já estava bastante associada a pautas sobre comunidades negras e que queria explorar outros espaços e temas, ampliando sua atuação e seu impacto. 

?Não é questão de evitar a periferia, muito pelo contrário. É reconhecer que já existe muita gente incrível fazendo esse trabalho, e eu queria também ocupar outros lugares, contar outras histórias, mostrar outras perspectivas?, explica. Essa decisão foi um passo importante na sua trajetória. 

Entre novos horizontes e sonhos antigos

Aos 15 anos, Bruno desembarcou em São Paulo acompanhado da mãe, com o coração cheio de expectativas. ?Quando cheguei, pensei: 'Quero morar aqui'.? Mais do que o tamanho da cidade, foi a certeza de que ali ele encontraria espaço para expandir seus sonhos e fazer acontecer. Com uma coragem que sempre o acompanhou, Bruno enxergou na cidade não um desafio, mas uma oportunidade, a chance de crescer, aprender e construir uma trajetória.

A vida sorriu para ele em dezembro de 2020, quando surgiu uma vaga de produtor no principal jornal da CBN São Paulo, ao lado de Milton Jung, seu ídolo no rádio. Bruno não pensou duas vezes: pediu demissão, trocou de cidade e mergulhou no desafio. Durante dois anos e meio, trabalhou ao lado da referência profissional, de quem se tornou colega, amigo e aprendiz. Foi o próprio âncora quem o incentivou a se arriscar na reportagem. 

O momento de virada veio com a enchente que atingiu o Rio Grande do Sul. Inquieto em São Paulo, Bruno insistiu até conseguir autorização para cobrir a tragédia na terra natal. Veio às pressas, ficou hospedado na casa dos pais e passou dias no ar, da manhã até a madrugada, na programação da rádio CBN. O trabalho chamou atenção. Um ex-colega, Matheus Meirelles, prestes a deixar a emissora de televisão CNN, indicou seu nome. O atual chefe do veículo já havia ouvido Bruno durante a cobertura e o convite veio logo depois.

Microfone, câmera e bastidores 

Hoje, Bruno vive um novo momento na carreira: é repórter de TV após uma vida inteira no rádio. Aprender a se comunicar com a câmera, pensar em imagem, construir a narrativa visual - tudo é novidade. Ele admite que ainda está em adaptação, mas se encanta com as possibilidades que a telinha oferece. ?É diferente do rádio, onde posso ler a notícia. Na TV, uso o celular como apoio, mas preciso aprender a contar de outro jeito, a decorar mais, a confiar na forma como me expresso.?

A vida de quem trabalha com notícia raramente é previsível. No caso de Bruno, então, nem se fala. Entre links ao vivo, madrugadas na redação e o corre-corre da apuração, ele coleciona histórias que dariam um podcast só de bastidores. 

Como esquecer da cobertura histórica da enchente no Rio Grande do Sul? Sendo ele um porto-alegrense reportando sua cidade devastada, e o desafio era ainda maior: contar com clareza e empatia para o público paulista, que não conhecia a realidade da capital gaúcha. ?Teve dias que eu simplesmente não conseguia segurar o choro na rua?, relembra, completando: ?A gente vive a notícia ali, na pele. É exaustivo, mas também muito forte?, resume.

Mas nem só de tragédia se fazem as histórias de redação. Tem aquelas surreais, dignas de roteiro de comédia. Como quando Bruno ainda era estagiário e se meteu numa caçada quase cinematográfica por um personagem envolvido nas operações da Lava Jato. Procuravam um investigado, mas o cara era homônimo do verdadeiro alvo. Mesmo assim, a missão era localizá-lo - e com urgência. 

Descobriram que a pessoa confundida tinha uma oficina em Minas Gerais. Bruno recorreu ao Google Maps para achar um endereço, e localizou o número de telefone de uma floricultura, na mesma rua. Ele ligou, se apresentou como jornalista, e do outro lado a pessoa respondeu: ?Ah, você tá falando do vizinho envolvido no caso da Polícia Federal, né??. Bingo! Conseguiram colocar o sujeito no ar, a apuração acontecendo ao vivo, enquanto o 'Timeline' estava no ar. 

Já na CBN, os bastidores também renderam pérolas e o famoso ?corre?.  Um dia, quando ainda participava dos destaques do 'Jornal da CBN', Bruno acompanhava os comentários da live e um ouvinte disparou: ?O Jô Soares morreu e vocês estão falando de futebol??. Era 5h35 da manhã e o programa que ele produzia, ao lado de Mílton, entrava no ar às 6h. 

Bruno foi checar a informação e, num site, encontrou a notícia. Correu pra confirmar, repassar o texto, acionar o editor e preparar o programa do zero. No fim daquela manhã, além de uma edição histórica, ainda conseguiu colocar o Boni, - sim, o Boni! - ao vivo no programa. ?Foi inesquecível?, lembra, com os olhos brilhando.

E no meio de tanta história grandiosa, tem também o dia comum, que começa cedo, entre 7h e 9h da manhã. Pauta na mão, apuração no ar. Sua atual rotina tem dias de link, dias de evento, dias de reportagem com cinegrafista ou sozinho, com o celular na mão. Depois do fim do expediente, é hora de voltar para casa, o que ocorre entre 15h ou 17h, a depender do horário que entra na emissora. Bruno olha pra tudo isso com gratidão e pé no chão: ?Nem sempre a pauta vira matéria, mas sempre rende aprendizado?.

Representatividade, propósito e o elogio que ficou

Era mais um dia de cobertura em São Paulo, e Bruno lembra que, pessoalmente, aquele não estava sendo um dia fácil. Mas tudo mudou quando, no meio da correria, foi parado por um homem negro na rua. ?Te vejo todo dia na TV do meu trabalho, que fica sintonizada na CNN. Sou o único negro no meu escritório. Tu me dá força.? O gesto simples o atravessou. Mais do que microfone ou câmera, entende que há uma missão por trás do jornalismo que exerce. ?Não quero ser o repórter negro apenas para falar de comunidade. Quero cobrir tudo: política, economia, cultura. Quero estar em todos os espaços.?

E ele vem conseguindo!  Bruno participou duas vezes do programa Roda Viva, um verdadeiro marco para muitos profissionais da Comunicação. ?Acho que boa parte dos jornalistas sonha, pelo menos uma vez, em estar lá, entrevistando?, contou.

A primeira vez, há um ano, foi durante um programa especial de eleições, e ele lembra o nervosismo da estreia. ?Tenho o quadro em casa com a charge que o Luciano Veroneze - chargista oficial do programa - fez, mostrando eu fazendo uma pergunta para a Tábata Amaral, então candidata à prefeitura da capital paulista. Na segunda participação, já mais solto e confiante, fez perguntas ao secretário de meio ambiente de São Paulo. ?Foi muito bacana, um momento de muita satisfação.? Para Bruno, essas conquistas reforçam que a decisão de ir para São Paulo valeu a pena. 

E os sonhos não param. Afinal, este jornalista se abastece deles. Bruno almeja ser apresentador: de rádio, de TV, ou quem sabe dos dois. Mas não tem pressa. Por enquanto, segue onde mais gosta de estar: na rua, atrás da notícia, com os pés no chão e o olhar curioso de quem sabe que boas histórias ainda estão por vir. Vai contando as dos outros enquanto escreve a sua, capítulo a capítulo, misturando Caetano, futebol, jornalismo, vinis, filosofias, encontros, desencontros e recomeços.