Diversidade e Comunicação: Mands e a troca feita com empatia e ações

Profissional, que é community manager, publicou artigo em Coletiva.net e conversou com Luan Pires

Amanda Abreu é uma pessoa não-binária - Arquivo pessoal

Amanda Abreu, ou Mands, é Community manager - gerente de Comunidades, em tradução livre - na W3haus. De vivências variadas, tem uma criatividade e um senso de se colocar no lugar do outro o que, indiretamente ou não, levaram ela para a área de Publicidade: mais especificamente personificando marcas nos contatos com seus públicos. Além de uma linha de roupas com estampas autorais, Mands é não-binária e mostra de diversas maneiras que sua criatividade extrapola qualquer caixinha.

Antes de mais nada, você se define como uma pessoa não-binária. Como prefere que eu chame você e quais são os seus pronomes?

Pode ser Amanda, Mands. O que você achar melhor. E pode ser ela, ele, elu. Tanto faz.

Legal. Agora, me conta um pouco de como você chegou onde está? Como foi essa caminhada?

Eu tenho 28 anos e comecei a trabalhar desde cedo em diversas áreas. Fui recepcionista em uma escola de inglês e, nessa época, já queria ter meu próprio negócio. Eu tinha uma lojinha virtual de roupas, já que minha mãe e minha dinda são costureiras, e para divulgar era eu quem cuidava das redes sociais. Comecei, então, a aplicar esse conhecimento no curso de inglês em que eu trabalhava. Depois, fiz o meu curso técnico e, resumidamente, hoje trabalho como community manager na W3haus. 

E como é ser a personificação das marcas na hora de conversar com o público? Pergunto isso já que envolve muito mais do que só responder as pessoas, né?

É interessante esse paralelo. Porque na maioria das marcas não existe uma identidade de gênero, as marcas não querem se assumir como uma mulher ou um homem. Mas, claro, todas tem uma persona. Então, existe também um trabalho criativo de pensar bem o texto para não precisarmos usar nenhum pronome que indique gênero. A preocupação é nunca excluir ninguém no discurso. Uma vez eu dei uma palestra sobre linguagem neutra, porque é essa linguagem que a gente tá tentando botar mais em uso no dia a dia, ainda que exista muito preconceito. Tem pessoas que fazem piada, mas o que elas não entendem é que a linguagem neutra não fala só sobre pronomes, mas frases que não denotam gênero e que ela vai ser usada em contextos específicos dependendo da audiência e do público. Teve um trabalho muito legal que eu fiz em que eu precisava basicamente trazer para toda uma plataforma uma linguagem mais simples, mais inclusiva. É outro exemplo do uso da linguagem neutra como ferramenta de inclusão. Meu trabalho sempre foi baseado nisso. Principalmente, ao responder pessoas, o que fez todo sentido com o meu 'eu' pessoal também.

Como é para você lidar com esse assunto no mercado de trabalho?

É parte do meu dia a dia: mostrar também a beleza da linguagem neutra, que é algo tão comum e menos 'o bicho de sete cabeças' que todo mundo pinta. Até para mim, quando eu digo alguns termos neutros, apesar de usar todos os pronomes, tenho um estranhamento porque o meio em que eu estou isso não é usual, ainda. Por isso, a gente precisa fazer e repetir as coisas várias vezes para elas se tornarem mais comuns. Como perguntar, nos casos cabíveis, quais pronomes as pessoas preferem. A gente tem que normalizar isso. Eu me identifiquei como não-binária em 2020. Foi no meio da pandemia. Foi algo muito mais para fazer sentido para mim. Então, comecei a entender mais e conversar mais sobre: O que é ser homem? O que é ser mulher? Qual é o papel da sociedade nessa construção? Sou uma pessoa não-binária que é uma pessoa trans justamente por ser o contrário de cis, por não se encaixar nessa binariedade. Já trabalhei em muitas agências e, em geral, as pessoas acham que inclusão é abrir vagas afirmativas, só que é preciso saber o que você está trazendo para essas identidades dentro da empresa para realmente incluir. Você entende quem são essas identidades ou está aberto a ouvi-las?

Fazer ações práticas internamente, né?

Exato. Ações que não são escritas em pedra, mas estimulam o aprendizado contínuo. Treinar e humanizar as pessoas. Fazer palestras e tudo mais sobre linguagem, sobre inclusão e sobre humanidade, tudo antes de pensar em abrir vagas apenas por abrir. As pessoas têm medo de aprender. Mas, até nós estamos constantemente aprendendo. É maravilhoso que tantas pluralidades estejam despertando para a gente poder entender e falar sobre elas. É muito maior do que colocar alguém em uma caixa. Existem momentos em que eu vou estar mais feminina ou mais masculina, mas, ainda sim, estou aqui falando de roupas, são só roupas, sabe. É mais do que nos etiquetar com um pronome e usar ele sempre, como se fosse algo memorizado. Pergunta para a pessoa: Prefere ela? Posso usar ele? Uso só delu? Posso ir variando? Eu, por exemplo, não me importo. Mas palavras como "moça", "garota", "menina", me dão gatilhos. Então é ir observando, perguntando e usando linguagem inclusiva, os pronomes são uma pequena parte disso.

Acho legal porque toda essa discussão se reflete no teu trabalho. Se adaptar como marca para ser inclusiva sem perder sua essência.

Sim. Por exemplo, na minha marca de roupas (@trash.mess) não faço questão que as pessoas saibam que sou eu por trás da marca. Quero que elas se relacionem com a marca. Na Comunicação da minha empresa, hoje em dia, eu misturo mais os pronomes. Eu desenho desde 2018 e a minha marca de roupas é um grande projeto, mais do que simplesmente uma forma de renda. Até porque eu invisto muito mais do que ganho dinheiro com isso. O legal é que eu comecei a desenhar e amigos começaram a falar que comprariam tal estampa. Fiz vinte camisetas para começar e vendi todas.

O que você mais gosta do seu trabalho em si?

Eu gosto que a grande questão do community manager é você entender com quem está se comunicando e saber se portar a partir disso. Ouvir o que a pessoa tem para falar e ajudar a construir conteúdos cada vez melhores. Esse grande estudo de saber o que falar e o que perguntar pra construir com uma marca é demais. Porque a marca só vai construir algo ouvindo as pessoas. Quando entrei na Publicidade era muito mais 'estamos mandando conteúdos para vocês' do que o que 'o que vocês querem ver?'. Essa construção conjunta é o que eu mais gosto.

E o que é Diversidade e Inclusão para você?

Acho que é mais do que colocar pessoas diversas no mercado, é fazê-las se sentir aptas a realizarem seus potenciais. Preparar um ambiente para todas as pessoas fazerem o melhor que podem com equidade, com empatia. Acho que é isso.


Esta matéria faz parte de um conteúdo especial sobre diversidade e Comunicação, produzido por Luan Pires para Coletiva.net. Todas as semanas, o jornalista publica uma entrevista exclusiva com o articulista do dia. Para conferir o artigo de hoje, assinado por Amanda Abreu, clique aqui.

Autor
Luan Nascimento Pires é jornalista e pós-graduado em Comunicação Digital. Tem especialização em diversidade e inclusão, escrita criativa e antropologia digital, bem como em estratégia, estudos geracionais e comportamentos do consumidor. Trabalha com planejamento estratégico e pesquisa em Publicidade e Endomarketing, atuando com marcas como Unimed, Sicredi, Corsan, Coca-Cola, Auxiliadora Predial, Deezer, Feira do Livro, Museu do Festival de Cinema em Gramado, entre outras. Articulista e responsável pelo espaço de diversidade e inclusão na Coletiva.net, com projetos de grupos inclusivos em agências e ações afirmativas no mercado de Comunicação. E-mail para contato: [email protected]

Comentários