Giba Assis Brasil: Ele acredita no aprender

Cineasta, professor e jornalista é fascinado por literatura, sétima arte e trabalho em conjunto

Gilberto José Pires de Assis Brasil traz na bagagem 35 anos à frente da Casa de Cinema de Porto Alegre e atuação como diretor, roteirista e montador de diversos filmes como, 'Deu pra ti anos 70' (1981); 'O dia em que Dorival encarou a Guarda' (1986); 'Ilha das flores' (1989); 'Houve uma vez dois verões' (2002); 'O homem que copiava' (2003), 'Meu tio matou um cara' (2004), entre outros. Professor universitário e cineasta, conhecido como Giba Assis Brasil, o filho mais velho do bancário e atleta Gilberto José Dornelles de Assis Brasil e da dona de casa Maria Mercedes Pires de Assis Brasil nasceu em 5 de abril de 1957, em Porto Alegre. 

Da infância, lembra quando morava no bairro Cidade Baixa, na Rua Alberto Torres, em uma casa com pátio grande e uma goiabeira, por onde ele e o irmão, dois anos mais novo, Plínio Assis Brasil, costumavam brincar e comer a fruta direto do pé. Recorda também que as festas de São João eram realizadas no meio da rua, com direito a fogueira e guloseimas, e de ir a pé para a escola, passando pelos bondes que trafegavam pela Rua José do Patrocínio.

Da família, hoje sobrou só ele. A mãe já havia falecido quando o pai morreu em 2014, então os irmãos se abraçaram e falaram que agora só restavam os dois, o que foi por pouco tempo, pois seis meses depois foi a vez de Plínio partir, vítima de um ataque do coração.

Arte e comunicação em família

Casado há 34 anos com a também cineasta Ana Luiza Azevedo, que é sua sócia na Casa de Cinema, tem dois filhos, o Antônio, de 32 anos, que trabalha na área da Comunicação, e a cineasta da área de Educação Teresa, de 29. O casal se conheceu quando Ana, junto aos cineastas Jorge Furtado e José Pedro Goulart, resolveram fazer um curta-metragem chamado 'Temporal' e o convidaram para fazer a fotografia do filme. Giba negou, mas aceitou fazer a montagem. "Então, neste período eu acabei escolhendo a Ana e a montagem, e sigo com ambas até hoje", revela. 

Juntos, gostam, por óbvio, de ir ao cinema, visitar amigos ou recebê-los em sua casa. Além disso, costumam assistir a filmes e séries pela TV, uma vez que nem possuem mais aparelho para assistirem algum dos 1.100 DVDs que têm em casa. Destacando um gosto bastante eclético para a sétima arte, conta que o estilo favorito é a comédia triste, com personagens interessantes, que fazem rir e chorar ao mesmo tempo, como os filmes do diretor de cinema italiano Ettore Scola. Também adora ouvir música clássica, jazz e MPB. 

Católico não praticante, diz que é de esquerda, no sentido da esquerda humanista, que tem muito a ver com o cristianismo primitivo, de acreditar no ser humano como fundamento de qualquer forma de política e de existência das pessoas. "Inclusive no cinema, que me interessa muito como reflexo do que as pessoas vivem. Pois, se um filme não me ajuda a entender melhor quem são as pessoas com quem eu convivo neste planeta, eu não sei para que serve este filme", desabafa. 

Mais apaixonado pela literatura que pela sétima arte, diz que gosta muito de cinema, claro, mas é trabalho, então, se tiver que escolher entre ler um bom livro e assistir um bom filme, vai optar pela primeira. Sua formação foi com os escritores Julio Cortázar, Luiz Fernando Verissimo e Caio Fernando Abreu. Estes foram seus grandes interesses, passando por Machado de Assis e Honoré de Balzac. Entre as obras mais recentes que leu estão 'O Deus das avencas', de Daniel Galera; 'O avesso da pele', de Jeferson Tenório, e 'Tudo é Rio', de Carla Madeira. Além de muita literatura sobre o cinema e roteiro para dar as aulas. 

Confessa que nunca aprendeu a cozinhar, então, faz questão de lavar os pratos. Gosta de churrasco e todos os tipos de massas, principalmente se for acompanhado de uma taça de vinho. Mas o prato favorito é o guisadinho de arroz com farofa, da Ana ou da Bete, que é uma pessoa que já trabalha há anos com o casal e, hoje, mesmo aposentada, uma vez por semana cozinha para a família. "A Bete é uma cozinheira de mão cheia", elogia. 

Nos dias de folga, gosta de assistir aos jogos de futebol na televisão e, quando possível, vai ao estádio Beira-Rio assistir ao time do coração, Internacional, paixão que foi passada de pai para filho. Há mais de 15 anos não joga bola, atualmente, pratica, duas vezes na semana, pilates.  

Cientista e jornalista

Antes de enveredar para Comunicação e Cultura, Giba cursou Engenharia Química, na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs), pois, desde criança, quis ser cientista e pesquisador. Um ano depois, passou para o Jornalismo, na mesma universidade, e por algum tempo foi fazendo os dois cursos simultâneos, até se dar por conta que tinha muito mais assunto e afinidade com os colegas da Comunicação. Acabou optando só pelo Jornalismo, formando-se em 1980. Pensava em trabalhar com política nacional ou com cinema, jornalismo cultural. Porém, o único trabalho que fez com jornalismo foi trabalhando na área de Esportes, da Rádio Gaúcha, por três anos.

Ainda na faculdade, conheceu o cineasta e autor de novelas Nelson Nadotti, a quem criticava muito, mas acabou se tornando amigo e integrando o grupo de jovens cineastas gaúchos, destacando-se pelas produções em formato Super-8. Ao lado de Nelson, filmou o primeiro longa-metragem 'Deu pra ti anos 70' (1981), premiado no Festival de Gramado do ano seguinte. Nessa época, estava formado e trabalhando na Gaúcha, mas, para terminar o filme, colocar som e fazer montagem, percebeu que precisava de mais tempo e ter dedicação exclusiva para isso. Então, decidiu largar o emprego, certo de que procuraria outra ocupação no jornalismo, o que nunca aconteceu. Depois deste, apareceram diversos outros filmes e, por isso, nunca mais trabalhou na área de formação. "Estou até agora descobrindo o que vou ser quando crescer", brinca. 

Em 1983, realizou dois curtas-metragens: 'Expedicion Loch Nessi' e 'Interlúdio'. Em parceria com o cineasta Carlos Gerbase, dirigiu o longa 'Verdes Anos' (1984), baseado no conto homônimo de Luiz Fernando Emediato. Entre 1982 e 1988, trabalhou como assistente de direção para cineastas gaúchos e, em 1987, criou, junto com mais 13 pessoas que trabalhavam na área, a Casa de Cinema de Porto Alegre, que na época era uma cooperativa. "Alugamos uma casa para guardar as cópias dos filmes e podermos nos reunir para outros projetos. Só foi se tornar uma produtora alguns anos depois", explica. Hoje, a empresa conta com quatro sócios, Giba Assis Brasil, montador; Nora Goulart, produtora; Jorge Furtado, roteirista e realizador; e Ana Luiza Azevedo, roteirista e realizadora. Por quase 20 anos, o quadro de sócios também contou com Carlos Gerbase e Luciana Tomasi

Professor de Notório Saber

Foram três longas de Super-8, 'Deu pra ti anos 70', em 1981, 'Coisa na Roda', em 1982, e 'Inverno', em 1983, o qual ganhou o Festival de Gramado e foi exibido nas salas de cinema. Ao mesmo tempo, para ajudar na renda, Giba dava aulas particulares de Matemática, Física e Química. Até começar a fazer curtas-metragens, e com a Lei do Curta, que existia na época, conseguiam fazer um filme com pouco dinheiro, exibir nas salas de cinema, e ganhar uma parte da bilheteria. "Lembro de dizer que, se a gente fizesse durar dois anos, seria a coisa mais importante que já fizemos. E estamos já há 35", orgulha-se. 

Em 1991, o Carlos Silva, dono da antiga Livraria Palavraria, que encerrou suas atividades em 2006, na época era o diretor cultural do Sesc e o chamou para dar aula de cinema para o pessoal do interior do Estado. Giba nunca havia pensado em ser professor, foi um grande desafio. Começou com o curso Leitura Cinematográfica, que depois passou a se chamar Leitura Audiovisual. Acabou gostando tanto que, em 1994, candidatou-se para vaga no concurso público da Ufrgs, para lecionar. 

Passou em primeiro lugar e foi professor na Federal do Rio Grande do Sul por 10 anos, até optar por ajudar a montar e estruturar o Curso de Realização Audiovisual da Unisinos (CRAV), em 2003, onde dá aula até hoje. Tentou conciliar as duas universidades e mais a Casa de Cinema, mas precisou decidir e escolheu permanecer como docente em São Leopoldo. Defendendo que não existe ensinar, existe aprender, explica que o que consegue fazer como professor é uma performance para os alunos para mostrar o quanto se interessa por determinado assunto. "Isso é o que vai fazer com que alguns alunos se interessem e construam conhecimento para eles próprios. O meu entendimento de Paulo Freire é este. Não existe ensinar, tu tens que fazer os alunos aprenderem", argumenta. 

Recentemente, para poder continuar dando aulas na Unisinos, recebeu um Notório Saber, expressão utilizada pelas universidades brasileiras para qualificar o professor que não fez um curso de doutorado e que, por isso mesmo, não tem o título de doutor, mas possui conhecimentos equivalentes. Definindo-se como uma pessoa que gosta de trabalhar em conjunto e em criar com os outros, conta que o que o fascinou em seu primeiro filme foi trabalhar unido a uma comunidade criativa e ver, no resultado final, um pedaço de cada uma das pessoas que haviam atuado naquele projeto. 

Para a próxima década, pretende trabalhar, continuar ensinando, ter alunos e pessoas com quem compartilhar coisas novas e ver se de alguma maneira consegue ajudar as pessoas a serem um pouco mais compreensivas umas com as outras. Sentindo-se realizado, diz que não quer dizer que esteja satisfeito. "Eu quero ir adiante, trabalhar e continuar. Vou ter uma aposentadoria, mas só depois dos 120 anos, porque até lá eu pretendo continuar trabalhando", projeta.

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