Petrópolis: "Meu filho escapou da minha mão", diz entrevistado, a Eduardo Matos

Rádio Gaúcha foi a única emissora do Rio Grande do Sul a enviar equipe para cobertura jornalística na cidade serrana do Rio de Janeiro

Eduardo Matos durante a cobertura em Petrópolis - Arquivo Pessoal

Para participar da cobertura da forte chuva que devastou Petrópolis, na região serrana do Rio de Janeiro, o repórter Eduardo Matos se preparou. Mas ouvir do entrevistado, senhor Adauto, "Meu filho escapou da minha mão", abalou o experiente jornalista. A rádio Gaúcha foi a única emissora do Rio Grande do Sul a enviar equipe para cobertura jornalística na cidade. Coletiva.net entrevistou com exclusividade o enviado especial.

Foram quatro dias de intenso trabalho, que exigiu preparo emocional e operacional. Matos não conhecia Petrópolis e, ao ser designado para a pauta, precisou estudar o terreno, saber mais sobre o Morro da Oficina, uma das áreas mais atingidas pela enxurrada e onde se concentram as buscas aos mais de 100 desaparecidos. "Uma coisa é ver na TV o ônibus sendo arrastado pela chuva. Outra, é estar na cidade e ver tudo destruído, as ruas cobertas de lama e as pessoas chorando sem parar", lamentou. 

Acostumado a cobrir casos de enchentes e viajar em razão do trabalho, na mala do repórter não faltam o carregador de celular e a capa de chuva, mas desta vez decidiu levar um par de botas que pegou emprestado de um amigo: "Em alguns pontos no Morro da Oficina, a lama chegou até a ponta de cima do calçado, tirei meu pé porque eu ia afundar", detalhou.

Choro, pausa e um abraço

"Educação, calma e sensibilidade são fundamentais quando o assunto é tragédia", afirmou o repórter que tem 20 anos de Gaúcha. Ele ressaltou que, em situações como as de Petrópolis, o jornalista não pode "chegar com o microfone em mãos" para ouvir a fonte. É preciso respeitar o momento de dor que as pessoas estão vivendo. E foi o que ele fez ao entrevistar, ao vivo, o senhor Adauto, que perdeu a esposa, a filha pequena e o filho de 21 anos. "Em um ponto da entrevista, ele chorou, eu parei, avisei que ele não tinha condições de seguir, mas o entrevistado fez questão de voltar. E, segurando a minha mão, finalizou o depoimento", recordou. 

Matos defende que o jornalista precisa se manter distante da pauta, não se envolver demais com o assunto, mas sabe que, em situações como a vivida recentemente, isso não é possível. "Quando terminou a entrevista do seu Adauto, eu devolvi para a Mariana Ceccon, desliguei o aparelho e dei um abraço nele. Porque a gente também é humano e sente a dor das pessoas", desabafou. Outro momento marcante foi quando viu a entrevistada gaúcha, que tinha conversado com ele no dia anterior, receber a notícia de que haviam encontrado o corpo da neta de cinco anos. "Ela desabou do meu lado", contou. 

Estratégia em campo 

Cobrir enchentes faz parte do currículo do jornalista, que lembrou durante a entrevista da loucura que fez ao entrar ao vivo no 'Brasil na Madrugada', com água no peito pelas ruas do Vale do Caí. Outras coberturas também marcaram o repórter, que acompanhou o caso da Boate Kiss desde 2013 e, antes do julgamento, entrou na danceteria; ver os 50 corpos velados na Arena Condá, após a tragédia com o voo da Chapecoense também foi impactante. 

"Como faz para ir ao banheiro?", a pergunta nem soou estranha ao repórter, que admitiu não ingerir muitos líquidos em coberturas extensas. "Bebo pouco nessas situações. Além do mais, quando trabalho de forma intensa, não tenho fome. Não quero perder nada", confessou.

Clima amistoso 

Se o assunto é doloroso e envolve enorme comoção, pelo menos o clima é amistoso entre os demais jornalistas. Mesmo "sendo de fora", Matos contou que foi bem recebido e falou também sobre a troca que teve com os demais colegas de profissão: "A repórter da TV Globo estava em uma viatura da PM para subir o morro da Oficina quando me viu e falou 'sobe aí'. Em cima do morro, eu a ajudei a subir uma escada", lembrou. O repórter retornou ao Estado neste domingo, 20, e hoje está de folga. 

A equipe de Coletiva.net acompanha o trabalho dos gaúchos envolvidos na tragédia em Petrópolis. Após entrevistar o apresentador da TV Globo, Flávio Fachel, amanhã será a vez de saber mais sobre a experiência vivida por Paloma Poeta, repórter da Record TV do Rio de Janeiro. 

Comentários